De longe, avistamos a casinha de taipa e o lixo. Um lixo que permeia
toda a cidade alagoana de Canapi e que retrata o esquecimento no qual toda
aquela comunidade vive. A cidade tem 17 mil habitantes, muitos deles moradores
de áreas rurais.
Vários quilômetros de estrada de terra separam uma casinha da outra. Uma
distância que espalha os sofrimentos comuns a todos moradores: falta de água,
falta de alimento, falta de estrutura, falta de condições dignas de
sobrevivência.
Ao vencermos a poeira e o lixo, chegamos até a casa de dona Francineide
e de seus cinco filhos. No quintal, três ovelhinhas deslanadas - um bichinho
que mais parece cabra - dividem o espaço com uma galinha, um galo e um punhado
de pintinhos. Faceiros, eles entram e saem do cercadinho que esconde a bacia de
plástico que a família usa como banheiro.
Da porta da pequena casa de taipa vimos dona Francineide. De sua
cadeirinha de plástico, da qual pouco se levanta por conta da deficiência
física, ela diz: “Não repara, a casa é simples.” Na sala estão apenas duas cadeiras, uma mesa e
uma rede, que serve de cama para duas filhas maiores. No único quarto da casa,
uma cama ocupa todo o espaço. Nas paredes, sacolas de plásticos fazem a vez de
armário para as poucas roupas da família. Por entre os três pequenos cômodos
não há TV, rádio, livros, nem brinquedos. A casa miserável é impecavelmente
limpa e organizada, embora grandes frestas por entre os tijolos deixem entrar a
brisa do outono sertanejo, que ameniza um pouco o calor sempre escaldante, mas
não traz a chuva que todos esperam desde o ano passado para salvar a lavoura
deste ano.
E ali, no colo de dona Francineide, estava Elisa, a caçulinha. Uma
menina de 10 meses, de olhos grandes e expressivos. Muito séria, Elisa acompanha
atenta a movimentação atípica em sua casa. Brinca com um chapéu coco, afasta um
mosquitinho que insiste em pousar em seu nariz, se aconchega no colo da mãe
para, em seguida, se deliciar com uma bolachinha que acabara de ganhar dos
visitantes. Uma bolachinha deliciosa e oportuna que iria servir para aquietar o
pequeno estômago, até que o pai voltasse, quem sabe, com o almoço da família. Eram
11h da manhã e os únicos alimentos visíveis na casa eram pequenas frutas que estampavam
a toalha da mesa. Segundo dona Francineide, a comida do dia viria, “se Deus
quiser”, junto da féria que o marido iria trazer para casa, caso tivesse dado
sorte de conseguir algum trabalho nas roças vizinhas.
Puxamos mais um pouco de prosa, nos despedimos e, ao deixar a casa, agradecemos
a acolhida e acenamos para aquela família tímida, polida e que pouco sorri. Já
em direção à estrada, olhei pela última vez para a pequena Elisa e, lá de
longe, percebi que seus olhos grandes e agudos já eram também olhos resignados.
Ana Drummond Guerra
Maio de 2012